Câmara Inversa

sábado, março 29, 2008

Imagens discursivas e a Enunciação Jornalística - por Daniel Lopez

1 – INTRODUÇÃO



É preciso avançar o máximo possível no sentido de sugerir que a coisa toda está fundada nas operações da linguagem.

Stuart Hall, Da Diáspora (p. 355)


O sucesso conseguido pela televisão, desde sua origem, está calcado, entre outros fatores, em seu poder de conotação, ou seja, o poder de criar uma realidade particular, um mundo próprio, imaginário e mágico, em que nem sempre vigoram as regras e valores do mundo externo.

Operando através do caráter “mágico” da imaginação (Sartre, 1936), a televisão mediatiza a relação entre fato e espectador, em um processo em que não raro há subjetividade e conotação. Segundo Ernest Gombrich (1969), entre a representação e a realidade externa só há ilusão. É neste contexto que se pode ressaltar também as “hesitações” que acontecem no telejornalismo, em que a forma como as informações são mostradas e organizadas pode produzir um “efeito de real”, mas nem sempre refletir os fatos em sua forma mais consistente.

Por outro lado, partindo do princípio que a notícia possui características da narrativa, considera-se, aqui, a premissa de que ela também pode produzir efeitos de real, isto é, que é capaz de constituir o real. A partir do momento em que a notícia busca conferir uniformidade aos micro-aspectos do fato, produz-se um enredo, entendido como campo de problemas de uma experiência. Sendo a notícia, portanto, um enunciado ou uma seqüência de enunciados narrativos, torna-se possível a produção de notícias que abram margens à conotação.

O objetivo deste projeto, portanto, é desenvolver uma análise lingüística sobre a construção de sentido, com base na Análise de Discurso francesa (principalmente a partir da obra de Dominic Maingueneau) tendo como foco o ethos construído (produzido) pelo casal Fátima e William Bonner.
Desse modo, a justificativa da relevância deste projeto reside na possibilidade de se analisar a construção semântica dos enunciados no jornalismo televisivo, a partir de uma análise lingüística (Análise de Discurso). Além disso, a motivação para a presente pesquisa está na busca pela compreensão do modo pelo qual o jornalismo televisivo, através das ferramentas discursivas, atua na construção da semiosfera e noosfera sociais, já que funciona como produtor de significados e valores que serão compartilhados pelo conjunto da sociedade. Assim, o presente trabalho permitirá uma visão mais acurada sobre a força do jornalismo televisivo na configuração lingüística e social brasileira.

Palavras-chave: telejornalismo; ethos; Análise de Discurso; mídia; mediação.


2 - PROBLEMA

A pergunta central que ganha motivação a partir da análise aqui proposta é: De que maneira o ethos produzido pelo casal Bonner determina significados e posições de sujeito no Jornal Nacional (JN)? Poderíamos dizer que há uma interferência da imagem do casal ao reportar a notícia, já que em seus enunciados podem ser observados traços deste ethos conjugado? Como, portanto, os enunciados do JN operam as ferramentas lingüísticas e discursivas para produzir “efeitos de discurso” específicos?

Ao reportar um discurso, os apresentadores se envolvem com o que está sendo dito? De que maneira este ethos composto atua no sentido de simular ou reelaborar as palavras de um entrevistado?

Segundo Chiavegatto (2001:244),

O jornalista ativa os domínios cognitivos das ‘outras vozes’ armazenadas na memória. Entre os elementos que o compõem, lança luz (o foco) sobre aquilo que lhe interessa focalizar, fazendo os recortes que achar conveniente (…). O discurso jornalístico exige que o profissional saiba muito bem quando deverá usar um discurso direto, indireto ou uma paráfrase: cada construção revela a ideologia dos sujeitos que a constroem.

5 – CORPUS DE ANÁLISE

O trabalho tem como principal objeto de estudo o jornalismo televisivo noturno da TV brasileira, de modo particular, o Jornal Nacional, da Rede Globo. Para tanto, a investigação compreenderá pesquisa bibliográfica.
O interesse pelo corpus em questão advém do fato de que o Jornal Nacional é o de maior audiência do país, tendo, portanto, grande influência sobre a conjuntura nacional. Além disso, o programa é ricamente ilustrado por gráficos, efeitos visuais e sonoros, cenários, jogos de câmera (travellings e panorâmicas), expressões faciais dos apresentadores e os diversos recursos da língua e do discurso.
Para o desenvolvimento do trabalho, serão utilizados os seguintes procedimentos:

- Acompanhamento e gravação de 10 edições do Jornal Nacional. Para que haja maior abrangência, a proposta é acompanhar uma edição por semana, o que resulta no acompanhamento do jornal por 10 semanas;
- Revisão bibliográfica e analise sobre o tema em livros, dissertações, teses e artigos.

4- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A fundamentação teórica, como fonte principal de sustentação da análise coloca em pauta conceitos da Análise do Discurso, para atendimento do ethos do casal apresentador do JN.
Os primórdios do conceito de ethos podem ser encontrados na Retórica de Aristóteles. Para este filósofo grego, ethos se relacionava diretamente aos meios através dos quais o orador, por meio de uma maneira de dizer peculiar, conseguia cativar a platéia, a fim de que aceitassem seus argumentos. Era através dos recursos do ethos que os ouvintes dariam credibilidade ao discurso do orador.

No entendimento de Eggs (1999), Aristóteles se referia a ethos como algo relacionado à idéia de honestidade. Dominique Maingueneau (1987 e 1999), levando o conceito de ethos para o contexto da Análise de Discurso, passa a entendê-lo como característico de uma prática discursiva.


6 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
6.1 – Referências principais:

CHIAVEGATTO, Valéria Coelho. Construções e funções no discurso jornalístico: o processo cognitivo de mesclagem de vozes. In AZEREDO, José Carlos de. Letras e Comunicação. Petrópolis: Vozes, 2001.

FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. Rio de Janeiro: Loyola, 2004.

___________. As palavras e as Coisas: Uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

HALL, Stuart. Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte, UFMG, 2003.

LOPES, Maria Immacolata Vassalo de (org.). Epistemologia da Comunicação. São Paulo: Loyola, 2003.

MAINGUENEAU, D. 1987. Novas tendências em Análise do Discurso. 3ª ed. Campinas.

MAINGUENEAU, D. 1999. Ethos, cenografia e incorporação. In: AMOSSY, R. Imagens de Si no discurso. Trad. Dilson F. da Cruz; Fabiana Komesu e Sírio Possenti. São Paulo: Contexto, 2005.

MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos Meios às Mediações – comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2002.

PINTO, Milton José. Comunicação e discurso – introdução à análise de discursos. São Paulo: Hacker, 2002.

ROCHA, Everardo. A sociedade do sonho: Comunicação, Cultura e Consumo. Rio de Janeiro: Mauad, 1995.

SILVA, Patrícia Alves do Rego Silva. As marcas da enunciação no texto jornalístico policial. www.filologia.org.br/viicnlf/anais/caderno07-02.htm

VASCONCELOS, Z. A Linguagem enquanto tecnologia de representação. Rio de Janeiro: Ed. UERJ, 2004.

6.2 – Referências auxiliares:

AGUIAR, Vera Lúcia Teixeira de. O Verbal e o Não Verbal. São Paulo: Unesp, 2004.

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1979.

BARTHES, Roland. A Morte do Autor, in O Rumor da Língua, Lisboa: Edições 70, 1987.

BARTHES, Roland. Elementos de Semiologia. São Paulo: Cultrix, 1971.

BRETON, Philippe. A Manipulação da Palavra. São Paulo: Edições Loyola, 1999.

CASTORIADIS, Cornelius. A Instituição Imaginária da Sociedade, 2ª edição, tradução de Guy Reynaud, R.J., Paz e Terra, 1982.

DETIENNE, Marcel. Os Mestres da Verdade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.

ECO, Umberto. A Busca da Língua Perfeita. Bauru: USC, 2002.

ESPINOSA, Baruch. Ética. Lisboa: Relógio D’Água, 1992.

HEGEL, G. W. Friedrich. Fenomenologia do Espírito. Petrópolis: Vozes, 2002.

SARTRE, Jean Paul. A Imaginação. Difusão Européia do Livro, São Paulo: 1964.

SCHOPENHAUER, Arthur. Mundo como Vontade e Representação. Rio de Janeiro: Contraponto, 2001.

1 Comments:

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    By Anonymous Anônimo, at dezembro 22, 2009 8:15 AM  

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